Audiência pública discute autonomia da gestante e direito ao parto cesárea
O projeto de lei ordinária nº 156/2019 foi ponto de pauta da audiência pública realizada pela Comissão da Criança e do Adolescente, Família e Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa, na tarde desta segunda-feira, 10. A matéria, de autoria do deputado Galba Novaes (MDB), tem como objetivo garantir à gestante a possibilidade de optar pela cesariana a partir da trigésima nona semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal. A proposição aguarda um parecer técnico para ser submetida a apreciação do plenário da Casa. Sob o comando da deputada Fátima Canuto (PSC), que preside a Comissão, a audiência pública contou com a participação de especialistas no assunto e representantes de entidades que defendem o parto humanizado como um direito essencial da mulher, para que tenha maior autonomia de decisão na hora em que for dar à luz.
Além da deputada Fátima Canuto, as deputadas Ângela Garrote (PP) - vice-presidente, Jó Pereira (MDB), Cibele Moura (PSDB) e Flávia Cavalcante (PRTB), membros da Comissão da Mulher, também participaram da audiência, que contou ainda com as presenças da presidente da Associação Para Mulheres (AME), Júlia Nunes; da vice-presidente da Associação das Doulas do Estado de Alagoas (Adoal), Bruna Sales; da supervisora-geral da Maternidade Santa Mônica, Elizangela Sanches; e do representante do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde (Cosems), Rodrigo Duarte.
Ao abrir a audiência, a deputada Fátima Canuto apresentou dados que apontam o Brasil como o segundo País com a maior taxa de realização de cesáreas do mundo, ultrapassando 55% dos partos, ficando atrás apenas da República Dominicana. “Esses dados contrariam a recomendação da Organização Mundial da Saúde, que preconiza uma taxa de 10% a 15% de cesarianas, considerando acima desses valores o risco maior de mortalidade da mãe e do bebê. É comprovado que o parto normal oferece maior saúde para a mãe e o bebê”, observou a deputada, acrescentando que, salvo alguns casos específicos de comprometimento da saúde da mãe e do bebê, é indicada a realização do parto cesariana. “São esses pontos contrários e favoráveis que levam a constantes discussões a respeito do tema que nos trouxe aqui; para juntos chegarmos ao melhor consenso, com encaminhamentos que venham beneficiar as mulheres do nosso Estado”, disse Fátima Canuto.
O deputado Galba Novaes observou que não tem nada contra o parto normal, e que não há nenhum estudo que correlacione a cesárea realizada a pedido da gestante, antes do início do trabalho de parto, com resultado da morte da mãe ou do feto. Mas que os casos concretos mostram que essas mortes ocorrem, em regra, quando se tenta por horas o parto normal, recorrendo-se à cesárea quando a situação já se encontra insustentável. “É importante reiterar que não se está advogando para impor cesárea a quem quer que seja, mas se a mulher não quer fazer o parto normal é imperioso que tenha seu direito de escolha atendido, até em razão dos riscos que circundam o parto normal”, observou o parlamentar, acrescentando que em 2016 o CRF, através da resolução 2.144, recomenda que o médico pode atender o desejo de sua paciente, desde que a gestante esteja com no mínimo 39 semanas. “Então já existe uma resolução que trata dessa questão, nós estamos apenas transformando em lei, respeitando a supremacia da lei, de forma mais abrangente”, justificou Novaes.
Para a supervisora-geral da Maternidade Escola Santa Mônica, Elizangela Sanches, a falta de informação, a referência de partos anteriores e a falta de oferta de parto humanizado são pontos que levam a mulher a escolher o parto cesárea. De acordo com ela, especificamente sobre o projeto em questão, há uma inversão de valores. “Que a mulher tem o direito de optar pelo parto cesárea e, caso queira o parto normal, ela precisa ter toda uma condição prévia para isso. O que vai de encontro ao que foi dito no início dessa audiência, ao que a OMS considera e recomenda”, disse. “O que a gente observa nas unidades hospitalares é a falta das condições de parto humanizado. A lei 8.130/2019, aprovada por esta Casa, já discorre sobre todas as questões referentes ao porto humanizado e aos direitos da mulher”, lembrou a supervisora, citando como exemplo o direito a alimentação, a acompanhante, a doula e a métodos farmacológicos para alívio da dor. “Que hoje é uma realidade quase ausente na maioria dos hospitais públicos e maternidades de Alagoas”, completou Elizangela Sanches.
O presidente do Conselho Regional de Medicina de Alagoas (Cremal), Fernando Pedrosa, disse que o Conselho Federal de Medicina, por meio da resolução 2.144, já garante alguns direitos sobre o parto cesárea, com critérios pré-estabelecidos. “Isso é um ponto pacífico até hoje. Inclusive na própria ginecologia e obstetrícia”, contou, dizendo que concorda que a melhor forma de se nascer é através do parto normal e que existem dificuldades em se garantir a assistência à mulher desde o momento da concepção até a forma de se parir. “Precisamos transformar a área obstétrica, porque o Brasil é campeão mundial em cesariana e eu não defendo isso. Mas quando a gente não vê esse direito para a mulher pobre, não encontra outra forma que não a obediência a autonomia”, declarou o presidente do Cremal, acrescentando que avalia o projeto como “enxuto, sem coisas mirabolantes” e que esse é o momento para discutir o tema. “Vejo como oportuna a defesa dessa situação, garantindo às mulheres esse direito”, disse Pedrosa.